Messages in a Bottle

"... send something to the world..."

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terça-feira, agosto 31, 2004

...

"lembro-me de ti
fazes-me bem

agradas-me
que acontecimento
agradas-me

fazes-me bem
matas-me"

(Margarite Duras)


* sónia

segunda-feira, agosto 30, 2004

Cheiros do Sul

Fui para sul... com passagem obrigatória pelo Paraíso. Não fiquei. Demasiado belo e perfeito. Aborreceu-me. Segui em frente rumo ao Oriente.

Aqui, onde o sol não se debruça sobre o mar para se esconder, onde o mar é mais azul e onde o vento sopra com aromas orientais, aqui a vida é marcada pelo compasso ameno do ócio.

O vento sopra forte mas não consegue derrubar-me. Cresci. Estou mais forte apesar de tudo ser apenas uma concha onde me refugio. O tempo também tem destas coisas: ao passar por nós, as nossas vidas também crescem connosco. Tudo se vai transformando tão lentamente que muitas vezes nem damos conta. “O tempo passa simplesmente... Compreenda quem puder.” (Samuel Beckett)... O tempo, esse salteador de memórias perdidas e achadas na inconstante linha da existência. Esse camaleão camuflado pelo instante, deixa vestígios quase imperceptíveis mas que lentamente forjam as cicatrizes que carregamos. Para onde me levas, ó tempo?

Os meus pés tocam a areia molhada. As ondas insistem galgar até à margem num movimento contínuo, repetitivo, constante. É esta a rotina das ondas. Não se cansam em vir até nós, sussurram-nos segredos e partem. Nunca percebi o que insistem em dizer-me. Mergulho e tudo passa...até o tempo. O vento calou-se. O mar está calmo agora e tudo está bem. Tudo parece bem, por agora.

Adoro beijar a pele salgada. Já me tinha esquecido como é bom saborear a tua pele salgada depois de teres sido acariciado pelas ondas do mar. Era capaz de ficar aqui dias seguidos sem mais alimento.

Nunca pensei que o vento se fosse embora. Estamos calados a ouvir o silêncio do mar. É bom. As pessoas passam e nem sequer olhamos para elas, são apenas figurantes de areia. A tua voz sempre teve um efeito reparador sobre mim. É bom voltar para ti de vez em quando. Faz-me bem. Fazes-me bem. Confortas-me nos teus braços e por momentos, instantes apenas, sinto que tudo vai correr bem. Estás de costas para mim mas eu percebo-te. Estamos mais velhos, eu sei. Nem precisamos de completar as frases. Eu sei o que vais dizes e tu às vezes também sabes.

Subo para a prancha e fico apenas a navegar sem rumo, a balançar ao sabor das ondas que remam até à areia. Do meio do mar tudo parece tão pequeno, insignificante até. Estou longe da margem. Aqui tudo está bem. Não sinto vontade de regressar. Aqui estou protegida pelo mar e pela distância. Sinto-me bem. As ondas começam a agredir-me e empurram-me para fora de água, expulsam-me do meu breve paraíso. Devem ter adivinhado os meus planos secretos para não mais abandonar o mar. As ondas levaram-me até à areia e iam-me sussurrando “Tu não podes ficar aqui...vai”.

É noite. As ruas estão vazias. Refugiamo-nos na praia onde ainda estão menos pessoas. Sinto a areia a espalhar-se pelos dedos dos pés e fico aconchegada pelas dunas. É noite e a areia está quente. Começamos a falar sem sentido aparente. Não concordamos sobre muitas coisas mas isso não interessa, nunca interessou. Estamos juntos e está um boa noite. O céu está claro e o mar calmo. Os nossos planos estão repletos de sonhos. E muitos deles vão ficar presos em miragens do passado. O tempo não nos dá tréguas e avança sem hesitação através das nossas vidas. Somos apenas passageiros do tempo. Vamos para onde ele nos levar e à velocidade do ponteiro dos segundos. Estamos condenados à sua sina. Não conseguimos controlar o tempo, nem o manobrar para correr ou abrandar. Temos que viver ao som do seu compasso.


* sónia













domingo, agosto 22, 2004

Amigo

Fecho a porta e na esquina esbarro com o único amigo que tive em 22 anos. Alguém que permaneceu comigo quando eu nem sequer sabia quem era ou quem queria ser, quando nem sequer pensava em pensar nisso. Acho que ainda hoje só tenho um frágil esboço do caminho que quero seguir. Não me aflige, já não me tira o sono à noite. Eu nunca soube ao certo o que queria [ou se calhar sempre soube demasiado bem e o medo impedia-me de o dizer ou fazer] e sempre decidi na urgência de virar a página. Não me aflige. Não gosto de agendas planeadas e de percursos estabelecidos. Tenho horror a que me digam o que fazer. Acho que por teimosia muitas vezes faço o oposto do que os outros têm planeado para mim, apenas para não cumprir o que estipulam por ordem divina.

Apenas tive um amigo em 22 anos. Um rapaz que me viu crescer e que cresceu comigo. Crescemos e aprendemos juntos os primeiros passos a caminho do incerto presente. Nessa altura, em que as andorinhas chegavam todos os anos com a mesma ânsia de saborear a Primavera, tudo era mais fácil porque tudo fazia parte da vida de uma criança a aprender quem ser num mundo de loucos com destino incerto. Tudo era possível. Era só esticar a mão e escolher. Tudo parecia longe e tudo está aqui agora.

“Assim vestida pareces uma criança”... Ainda sou, pai. Ainda não deixei de ser aquela menina que insiste em sonhar acordada. Ainda sou aquela criança que não se cansa em dizer «porquê?» e que pensa que alguém tem todas as respostas. Ainda tenho muitas perguntas mas tu já deixaste de me poder dar as respostas. Já nem sequer sabes que perguntas tenho feito, que dúvidas me têm assombrado, que incertezas permanecem em mim.

Hoje encontrei o meu único amigo. Tudo pareceu bem. Começámos juntos mas juntos não terminamos. Foste o meu único amigo. Durante anos, foste o único que ao olhar para mim não me retiraste cada peça de roupa apenas com um olhar incisivo. Nunca surgiu nada entre nós. Passámos juntos por muitas descobertas próprias de quem conhecia tão pouco o mundo. Fomos sempre amigos. Nunca sentimos mais. Nunca pensámos em sentir mais.

Agora penso que já não consigo ter amigos. Não percebo porquê mas afasto-me. Mais dia menos dia começam a querer mais e mais e para evitar tudo isso, afasto-me. Afasto os amigos que amo e os homens que não amo com um gesto só. Seria tudo perfeito se pudesse manter o amigo e ignorar o homem. Mas nem a perfeição mais divina consegue realizar tal profecia, de criar dois homens de um só.

Foi bom ver-te hoje. Fez-me lembrar quem fui ontem. E estranhamente, ou talvez não, mesmo sem planos e sem bússola, acho que sou hoje quem ontem sonhei ser.


* sónia

...

"Tudo desde sempre. Nunca outra coisa. Nunca ter tentado. Nunca ter falhado. Não importa. Tentar outra vez. Falhar outra vez. Falhar melhor." (Samuel Beckett)


* sónia

sexta-feira, agosto 20, 2004

Viagem Adiada

Cadeiras perdidas, cadeiras achadas. Corpos, tomates, cenouras, alho francês, pepinos, couves, massa, panelas, vinho tinto, um copo vazio, um copo cheio, uma mesa cheia, uma cama vazia.

As pessoas riem e eu sinto-me pequena, perdida, deslocada. Queria estar numa pequena ilha envolvida pelo calor do verde e do azul num sono profundo desprovido de razão. Apenas deitar-me e sentir-te perto. Os risos das pessoas começam a irritar-me! Estão todos felizes e sopram gargalhadas fáceis e simples. Compliquem-se! Compliquem-se um pouco! Não aceitem a piada fácil e o riso óbvio de quem não pensa! Virem o espelho ao contrário! Tenham medo de ser felizes!

Tudo está bem e tudo está calmo no reino da feliz fantasia. Deito-me contigo. A cama está vazia.


* sónia

quarta-feira, agosto 18, 2004

O Rapto

Fui raptada por extraterrestres. Durante o sono estranhamente profundo fui levada por seres esverdeados para a nave-mãe. Comigo fizeram as mais bizarras experiências que se podem fazer com um ser humano.

Mas sobrevivi. E depois de se terem cansado do meu corpo e de dissecarem a minha mente, depuseram-me de novo no leito das fantasias esquecidas pela passagem do tempo perdido no acaso dos sentidos incertos.

Acordei com uma borbulha do tamanho da cratera do Mauna Loa na parte de trás do pescoço. Onde terminam os extensos campos capilares castanhos claros e onde se inicia a zona das carícias proibidas, estavam os vestígios da minha viagem celestial da noite anterior.

Como não padeço de qualquer género de alergia [ a não da milenar «estupidez crónica»], deduzo que a minha borbulha se deve a um rapto extraterrestre, que foi consumado através de experimentações macabras a bordo um de OVNI.

Obviamente estou a excluir uma série de causas válidas para os sintomas apresentados. Mas se me limitasse a escrever: «Tenho uma borbulha na parte de trás do pescoço porque fui mordida por um insecto», as anteriores linhas nunca teriam alcançado a luz da existência e eu pelo menos não acharia o menor interesse na minha constatação do óbvio.

Por isso, porque não sobrevalorizar a criação da «borbulhática» celestial? Porque é que não posso simplesmente optar pelo mundo dos loucos?


* sónia

Love Recipe

Não me mintas. Se gostas de mim não digas essas coisas que sabes que não são verdade. Já não sou a menina que acredita no Peter Pan. Eu sei que ele existe, mas sei também que não está todos os dias ao virar da esquina. Sei que muitas vezes pensamos estar a viver um conto maravilhoso e depois das ilusões esquecidas, tudo não é mais do que um castelo de areia no meio de uma tempestade.

Dizes que me amas. O que sabes tu do amor? Usas essa palavra assim como se estivesses a pedir um pacote de batatas fritas no quiosque do bairro! Não uses essa palavras comigo. Não insultes a minha pouca inteligência. Não me conheces o suficiente para me poderes amar. Estás atraído pela cobertura mas nem imaginas o que está para lá do recheio. Estás a confundir tudo. Recomendo uma semana de férias para longe de mim.

Eu sei que estou carente. Já há muito tempo que ninguém me tocava assim. Há já anos que não sentia ninguém tão perto. Fazes-me bem. É bom. Mas não vou mentir e pintar esta tela com cores importadas do reino do amor. Sabes tão bem quanto eu que estaríamos a percorrer frágeis nenúfares com botas de chumbo.

Não me mintas. Não me digas que queres ficar comigo para sempre. Tu não sabes isso. Eu não sei isso. Nós não controlamos o que tem vontade própria. Vamos antes dizer que iremos ficar juntos enquanto nos sentirmos bem próximos. Ou melhor. Não vamos dizer nada. Vamos antes sentir e sentir o tempo a passar sem rotular para onde vamos. Não gosto de rótulos nem de carimbos nas mãos a gritarem «fora de serviço»! Isso não aumenta nem diminui o que eu sinto e também não deveria abalar o amor que dizes sentir por mim.

Eu quero querer alguém e quero estar com alguém que queira estar comigo. Durante quanto tempo não interessa. Eu apenas quero estar contigo enquanto tu quiseres estar comigo. Quando hoje sentires que amanhã não queres mais, diz-me. Eu farei o mesmo. Para sempre o tempo que sentirmos os dois. Uma tarde, um dia, uma semana, ... Não interessa. Apenas enquanto for verdade. Eu não quero fingir...eu não sei como.

Quero ficar contigo hoje e amanhã todos os dias enquanto sentirmos os dois.

É tão simples. É tão fácil.

Será que alguém entende o que estou a dizer?


* sónia

terça-feira, agosto 17, 2004

...

Quero sentir
Afasto a razão

A miragem apodera-se
do momento e propaga-se
no instante em que
o arrepio surge
e avassala o permanente

Não penso
Apenas sinto


* sónia

quarta-feira, agosto 11, 2004

Muralhas

Fujo para lá das muralhas
Nada me detém
percorro a brisa e
disperso-me pelo céu

Tudo é vago em mim
O vácuo percorre
as veias e espalha-se
Estou contagiada pelo momento
O instante é permanente

O mundo está aqui
Eu estou longe do mundo

Não estou onde quero
Desconheço para onde ir
O rumo do instante é a minha fuga

Só assim me sinto bem
Só assim me consigo encontrar
De novo
a tentar gritar

Doce frustração:
despenho-me e expludo
contra aquilo que sou!

Pedaços de mim voam
pelo ar e caiem
adormecem
apodrecem
Deixo-me morrer
por instantes
Estou longe daquilo que sou
Mas perto do que quero ser


* sónia

segunda-feira, agosto 09, 2004

Playing with Myself

Porque é que as pessoas ficam juntas? O que faz com que os corpos se aproximem? O que faz o outro ficar próximo daquele? O que faz os corpos afastarem-se? O que se terá perdido? Será que algum dia estiveram mesmo próximos? Será que alguma vez pensaram que seria mesmo para sempre?

Para sempre é muito tempo. Prometer para sempre é sempre uma falsa promessa. As promessas são mentiras disfarçadas. Ninguém pode prometer sentir o mesmo para sempre. Não é humano. Apenas se pode prometer querer sentir o mesmo que se sente hoje, mas nunca para sempre.

Querer sentir e sentir de facto. Posso não querer deixar de sentir e a realidade revelar-me que já não sinto. E aí, é a razão a querer sentir o que já não se sente, a insistir sentir o que já passou como presente. Presente envenenado: mais cedo ou mais tarde a verdade dos sentimentos vai emergir e tudo ficará claro. Todo o passado vai ser reconstruído pelo presente e tudo se vai perder, como um sonho que não se viveu, como uma ilusão que não se concretizou. Tudo vai ser deturpado e tudo se vai perder. Apenas vai ficar a verdade que resta em mim.

Estou rodeada por famílias felizes: um pai joga à bola com a filha, uma mãe compra gelados idênticos para os gémeos. E penso que nunca conseguirei ter isso. Invejo essas pessoas por um dia terem tido a certeza de quererem ficar para sempre com alguém e penso que eu nunca terei essa certeza. Invejo essa pessoas porque desse «amor para sempre» nasceram pessoas pequeninas que agora riem, choram e pedem amor e mais amor e de mim nunca vai nascer esse amor para sempre. Já não é possível comigo. Acordei dessa fantasia há muito tempo já. A verdade foi-me revelada e não consigo mais voltar à caverna das ilusões prometidas.

Eu acordei e tenho pena das pessoas que continuam a dormir. Adormeceram ao som de uma mentira e repetem-na dia após dia...e gostam e respiram nesse círculo fechado do qual nem pensam em sair. É mais seguro ficar protegido, embalado por uma não verdade para sempre. É tão mais fácil continuar a mentir do que aceitar o que se sente. É mais prudente não sentir. Assim não nos magoamos mais mas não vivemos mais.

Tenho pena dessas pessoas e invejo-as ao mesmo tempo. Eu já não poderei sonhar, amar, prometer, sentir...para sempre. Eu já acordei e essa parte de mim ficou adormecida com os sonhos que um dia tive de ser feliz. Já não quero essa felicidade.


Solução:

1) “O que une as pessoas é tão grande como o que as separa. E às vezes são coisas muito pequenas” (Alguém... que não o Parvo da Barca do Inferno de Gil Vicente)

2) “O cepticismo é a castidade do intelecto e é vergonhoso abandoná-lo demasiado cedo ou ao primeiro que apareça: há nobreza em conservá-lo serena e orgulhosamente durante a longa juventude, até finalmente, na maturidade do instinto e do entendimento, ser possível trocá-lo em segurança por fidelidade e felicidade.” (George Santayana, Scepticism and Animal Faith)

... A resposta encontra-se uma vez mais na passagem do tempo. Que génio é o tempo! Apenas ao passar pelas nossas vidas resolve todos os turbilhões...


* sónia

Bergman sorriu...

Saio de casa a correr. Não consigo ficar aqui nem mais um segundo! Tenho a cabeça demasiado cheia para conseguir introduzir mais elementos. Se mais uma pequena brisa conseguir penetrar no meu cérebro, eu temo que vou explodir de vez!

Rodo a chave e começo a percorrer a estrada como se estivesse a fugir. Por momentos sinto-me uma criança a fugir de casa, com uma mochila às costas e uma tablete de chocolate nas mãos. E é assim mesmo que me sinto. Como se me tivessem negado o brinquedo dos meus sonhos e eu tivesse esgotado todos os argumentos possíveis face a um irredutível “Não”! Incapaz de transpor esta barreira, tomo a atitude de fuga, sair dali o mais rápido possível, agravada pela possibilidade crescente de explodir a qualquer instante.

Não explodi. Em vez disso, um interminável tambor alojou-se na minha cabeça, mas que o Chiado minimizou ao disponibilizar-me quase prontamente um lugar para estacionar. Por vezes penso que esta cidade já me conhece. As suas estreitas ruas pressentem a minha chegada e acomodam-me nos seus braços laterais, nos quais deposito o meu cavalo azul, enquanto mergulho nos deliciosos prazeres urbanos de Lx.

Hoje tinha os «Sorrisos de Bergman» à minha espera. O relógio não parava e o telemóvel insistia em tocar... “Estou mesmo a chegar!”, repeti pelo menos três vezes. Atravessei o Chiado a correr como se o movimento rotativo do planeta dependesse da velocidade dos meus pés. Um mendigo pós-moderno atravessa a rua e exige dinheiro para comer. Recuso tal demanda, mas subitamente lembro-me da tablete de chocolate e sou impelida a desfazer-me desse prazer, por simples noção de dever. A criança é vencida pelo dever moral. Continuo a interminável travessia do Chiado, a rua do Carmo nunca pareceu tão comprida, nem a praça do Rossio tão longe. Homens estranhos dizem coisas que não entendo e provavelmente «será melhor ficarem imperceptíveis», penso, numa espécie de diálogo absurdo sem resposta coerente possível.

Chego finalmente e todos estão à minha espera. Um avassalador sentimento de vergonha preenche-me por momentos, mas estranhamente dissipa-se rapidamente. Uma vez mais sinto que a cidade me acolhe de braços abertos, num movimento aleatório há muito planeado, e por isso deixo de me sentir incomodada com a minha falha. Antes uma sensação de plenitude ofegante invade o meu espírito, enquanto me sento à frente dos panos brancos que me conduzem a outra vida, a minha talvez.

Vejo expressões que já foram minhas. Ouço palavras que ainda ontem disse. Chegam até mim emoções que há uns dias apenas senti. Tudo me fascina de uma forma profundamente estranha mas previsível: esta podia ser uma história sobre mim, ou melhor, uma das muitas novelas de que a minha absurda passagem pelo amor já foi palco. Ainda ontem eu vivi esta cena e hoje já alguém a escreveu, encenou e produziu!

Como tudo é rápido e previsível. Há quase meio século que Ingmar Bergman previu o que eu ia sentir hoje. Que génio ele é e que pouco original é o que eu sinto! Tudo não é mais do que uma previsível repetição daquilo que tentamos ser. Todos os nossos esforços são incapazes de produzir qualquer réstia de originalidade para os manuais sobre o amor: como encontrar algo raro e não o confundir com um embuste, quando a revelação da sua inexistência nos foi exibida há já muito tempo sem refutação convincente?

Tudo o que dizemos sentir torna-se rapidamente inadequado ao momento em que o afirmamos. Apenas o instante antes das palavras preencherem o silêncio dos corpos, em que o desejo de sentir nos impele ao toque, apenas esse instante é construído com verdade. Todo o resto é já reconstituído e reformulado por padrões estipulados não sei muito bem por quem.

Bergman ao sorrir recria o que eu ainda ontem senti...e sinto. Já nem sei que tempo usar. E se tudo o que dizemos se torna falso pela passagem do instante entre o sentir e a produção de palavras, o tempo do verbo torna-se irrelevante pois, no fim, tudo será igualmente uma infundada mentira no seio de uma receptáculo repleto de cinzas do que um dia sonhámos ser.


* sónia

domingo, agosto 08, 2004

... Memórias Esquecidas

Estou cansada
Quero o teu corpo
Nada mais agora

Beija-me, toca-me, sente-me

Não fales mais
Não digas isto
Não penses aquilo

Quero-te agora
Vem depressa


* sónia

Memórias Esquecidas...

rodas, rádios, ruídos
coisas confusas
palavras mudas
vácuo impaciente

o tempo que não corre
as árvores que se esfregam
e a vida que escorre

o mundo está feliz
com a palhinha que suga
o que quer
restos de mim
e o resto não interessa

um sussurro e
deixas-me despida
vulnerável ao perfume
brisa espalhada pelo corpo
nu de razão

dou o que não tenho
quase nunca
a certeza na dúvida
e o inconveniente «porquê»?

*sónia

sábado, agosto 07, 2004

Reinos Perdidos

coroas vermelhas do reino da dor e do amor descem do céu. luzes verdes e roxas incidem sobre alguém perdido na fronteira dos reinos perdidos no tempo. por vezes cores violetas surgem no escuro. telefones pendurados lembram-me que nos esquecemos de falar quando mais vontade temos de o fazer, que nos calamos quando as palavras escavam buracos nos lábios que as retêm.
somos apenas crianças a aprender a ser loucas num mundo de loucos.
barcos negros vêm em meu auxílio e já não consigo distinguir o real da ilusão! tudo me fascina. tudo me faz lembrar o que fui, o que sou e o que estou para ser.
sinto-me abraçada pelo verde que me envolve e me embala ao som de brisas do passado. "tanta beleza também cansa"!
está frio. apesar de tudo continua frio. e o verão ainda ontem começou.
* sonia

Para o Thomaz Napoleão

Que saudades dos nossos piqueniques nocturnos no Champ de Mars - regados a Bordeaux- e das minhas inúmeras tentativas para convencer um perito da Sétima Arte que o cinema de Bollywood até tem a sua piada... Valeu cara!

"Adeusinho"

carina

sexta-feira, agosto 06, 2004

Beautiful Girls

“A Nicky está na esquina e veste um casaco preto. Foge de uma casa desagradável onde tem um gato. Onde a encontras agora? Entre as luzes de néon que habitam as ruas… Ela diz: “Fica aqui comigo!” (INXS)
Carina

Consciência

“O único mestre que existe, o único verdadeiro e credível, é a nossa consciência. Para a encontrarmos temos de estar em silêncio – sozinhos e em silêncio -, temos de estar na terra nua, nus e sem nada à volta, como se já estivéssemos mortos.” (S. Tammaro)
Carina

CRITICISM

“The savages are upon me and I feel my flesh burn beneath the teeth of their indifference”

“I saw a woman whose teeth were straight like white picket fences.
Until she looked at her husband – then they looked like shattered windows.”
(Jewel)
Carina

Par-delà des nuages

“Acredito que nós avançamos empurrados pelo impulso vital que se manifesta em todas as coisas, que é a origem da vida, que criou o passado e criará o futuro. Enquanto que nós permanecemos sempre no presente convencendo-nos que nós também mudamos, quando temo que continuemos irremediavelmente nós próprios, tal como éramos no dia em que nascemos.”
carina

The Ground Beneath Her Feet


A maior parte de nós, ao chegar à célebre estalagem de Procrustes, havia de achar que o leito que nos oferecem é muito maior do que nós. No meio da noite ele iria prender-nos, sem se importar com os nosso gritos, até atingirmos o seu tamanho. Muitos de nós, que somos esticados a partir da nossa pequenez, invejamos os poucos heróis verdadeiramente grandes.“
(S. Rushdie)

Carina

Messages in a Bottle

"As mentiras mais cruéis são muitas vezes ditas em silêncio" (Robert Louis Stevenson)

* sonia