Messages in a Bottle

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quinta-feira, abril 21, 2005

NY

Lembro-me de te dizer "vem comigo a Nova Iorque..." e lembro-me como ficou gravado na minha pele eriçada o brilho dos teus olhos instantes antes de me responderes com um beijo.

Perdi poemas dias antes da viagem, mas nada de muito precioso - coisas cruas e excitantes, lixo de certo. Ainda procurei aqueles rascunhos, aquelas linhas desenhadas no impasse dos dias, mas não encontrei. Devem ter ficado escondidos na confusão do nosso quarto, horas antes da viagem - livros, cadernos, dossiers de arquivo a rebentar de folhas, estantes com autores esquematicamente desordenados e as nossas cartas soltas pela casa; havia amor também e era bom.

Nova Iorque: a primeira viagem que fizémos juntos depois da discussão junto ao cais, depois do primeiro beijo, depois de fazermos amor no comboio com destino a Sintra. Nova Iorque foi delicioso e os instantes antes em Lx - imprevistos e risos, peripécias e beijos - tornaram JFK a terra prometida e os nossos dias em Nova Iorque um doce refúgio.

Ainda me lembro de te dizer "vem comigo a Nova Iorque"...

segunda-feira, abril 18, 2005

conta-me histórias

E quando vieres falar de morte, quero estar de espada ao alto. E quando a morte chegar, sei que virá de mãos dadas com a surpresa de quem quer um pouco mais de silêncio, com o desejo de quem não sabe ao certo o que deseja, com a apneia de quem tem segredos e tesouros escondidos.

Conta-me histórias. Fala-me dos tempos de guerra, dos combates que perdeste quando o napalm te feriu os olhos, dos corpos que derrubaste para chegar ao fim da luta sangrenta dos dias, das granadas que lançaste para explodir o silêncio de quem sente a morte nas mãos.

Conta-me histórias. Não quero escrutinar o que desenhas no calor dos dias, fintar flores em férteis areias movediças ou acender a noite no lado escuro da lua.

Conta-me histórias. Ou então não digas nada simplesmente. Mas quando vieres falar de morte, traz uma flor contigo ou sopra uma pétala com o vento de hoje e hoje apenas.

quarta-feira, abril 13, 2005

*

estaciono do lado direito e espero. os candeeiros acesos parecem velas no escuro. as árvores, altas, cheias de folhas verdes, protegem os passeios dos doidos que passam. os carros correm e eu estremeço, as portas abanam e o rádio desperta no silêncio escuro com Shawn Mullins. os pés frios enrolam-se nas pernas num movimento curto, intenso, repetitivo, procurando o calor no interior dos músculos. as mãos tépidas desenham esboços de cores quentes, dispersas, constantes no cair dos dias. uma folha verde salta da árvore e mergulha na noite escura e eu espero.

domingo, abril 10, 2005

...




Novo Ano, mas não nova vida. Quem pensa em ser mais crédulo, se tem medo de ser enganado? Se o mundo é de enganos, por que não deixar que nos façam pirraças e troças? Ninguém quer ser parvo, e é pior: porque para não ser enganado, desonra-se como pessoa de lisura e sinceridade. Há mais cobardes em ser iludidos, do que em ir para a guerra. Quando os simples são afinal os mais poderosos e quem cede, ganha.

Agustina Bessa Luís

terça-feira, abril 05, 2005

*

II

Espreitava em seus olhos uma lágrima,
e em meus lábios uma frase a perdoar;
falou o orgulho, o seu pranto secou,
senti nos lábios essa frase expirar.
Eu vou por um caminho, ela por outro;
mas, ao pensar no amor que nos prendeu,
digo ainda: porque me calei aquele dia?
E ela dirá: porque não chorei eu?

Gustavo Adolfo Bécquer

I

Quando mo vieram contar, senti o frio
de uma lâmina de aço nas entranhas;
apoiei-me no muro e um momento
perdi a consciência de onde estava.
A noite abateu-se em meu espírito;
em ira e piedade afogou-se-me a alma;
e então compreendi porque se chora,
e então compreendi porque se mata!
(...)

Gustavo Adolfo Bécquer